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Sempre vou ao Brasil para visita de trabalho, assuntos pessoais e rever amigos. Assim que chego, principalmente no verão brasileiro, sempre me deparo com um choque térmico, saindo de -20C no Canada para 30C em São Paulo. Logo me vem uma recordação dos extremos de clima entre os dois paises e gostaria de compartilhar com vocês. Algumas coisas temos que fazer pelo menos uma vez na vida. Essa “loucura” eu fiz um pouco tempo atras e sozinha. Você já pensou em ficar hospedado em um hotel construído de gelo com uma temperatura externa de -20C? Muito provavelmente a resposta seria, NÃO, mas como eu disse, algumas coisas devem ser feitas pelo menos uma vez na vida.
Sempre ouvi falar do Hotel do Gelo no Canada, único na América do Norte. Resolvi viver essa experiência "maluca"; e parti rumo a charmosa e maravilhosa Quebec City. Decidi não pesquisar a fundo como seria ficar hospedada num Hotel de Gelo pois queria ter o "efeito surpresa". O Ice Hotel ou Hôtel de Glace (em Francês) está localizado a cerca de 4 km ao norte de Québec City, na Província de língua Francesa do Quebec. Por ser uma pouco mais ao Norte, Quebec City é mais fria do que onde moro. Da minha cidade são aproximadamente 6 horas de carro, mas no inverno pode demorar muito mais dependendo das condições climáticas. Preferi dirigir a pegar um avião, que também no inverno pode virar um outro pesadelo. Por sorte a viagem foi até tranquila, com poucos períodos de neve pesada caindo na pista.
O Hôtel de Glace está instalado no Valcartier Vacation Village, um complexo de entretenimento gigantesco que conta com diversas atrações no inverno. Na verdade tinha chegado a um resort de inverno com cara de Hotel igual a muitos outros. Mas onde estava o "meu" Hotel de Gelo? Estacionei meu carro em um estacionamento com outros milhares de carros e com muita ansiedade caminhei para a recepção do complexo. Depois de uma certa fila, fui atendida. Tenho uma reserva para o Hotel de Gelo, disse eu até um pouco eufórica. Fui muito bem atendida (sempre no Canadá) com um largo sorriso e todos falavam Inglês, o que me salvou, já que meu Francês é precário. Logo de início já recebi as importantes explicações. O Hotel foi construído com 500 toneladas de gelo e 40 mil toneladas de neve, e a cada ano um tema diferente inspira a decoração. Ele fica aberto apenas de janeiro a março, pico do inverno no Canadá. Cerca de 100.000 pessoas visitam o Hotel por ano e você tem a opção de ficar hospedado ou apenas visitá-lo e tomar um drink no “ice bar”. O número de suítes pode variar a cada ano. Se não me engano haviam 30 suítes quando fiquei hospedada, todas esgotadas. Posteriormente fui informada que chega a ter 40 suítes dependendo do rigor do inverno.
Para chegar ao Hotel, temos que caminhar cerca de uns 100m pela área externa do complexo para chegar até ele. Logo que vi a fachada ao me aproximar não fiquei tão impressionada, foi uma mistura de medo e até arrependimento. Fui em frente, afinal dirigi tanto para que? Não foi fácil fazer o trajeto a pé mesmo levando uma mala pequena, afinal tinha nevado muito nos últimos dias na região.
Ao entrar pela porta principal, um impacto, meu queixo literalmente caiu, fui tomada por uma grande emoção. Como pode existir algo como isso? A arquitetura é impressionante. O Hotel estava lotado. Turistas de todas as idades andando pelos corredores, todos com um sorriso no rosto e suas câmeras à mão. Vale lembrar que neste dia a temperatura externa era de -18C, porém no interior do Hotel ela é mantida a -5C. Podem não acreditar, mas isso faz a diferença. Já estava neste momento relaxada e certa que seria uma das experiências mais fascinantes da minha vida. Fui informada que a uma determinada hora o Hotel fecha para os visitantes e só ficam os hospedes.
Fui primeiro para meu quarto fazer o reconhecimento. Caminhei um longo corredor e cheguei a minha suíte. Ao entrar, outra surpresa. Uma escultura maravilhosa de gelo feita a mão na parede. O quarto tinha uma iluminação indireta e muitas velas e outros adornos fantásticos, criando uma atmosfera única e intimista . O colchão estava em cima de um bloco de gelo e um estrado de madeira. Testei o colchão e aprovei. Mas nesse momento nem pensava em dormir, queria conhecer o restante do Hotel. As únicas áreas aquecidas eram o banheiro e a cafeteria, mas localizados fora do Hotel, na área da recepção do complexo. Se quisesse ir a banheiro à noite, era preciso cruzar alguns corredores e caminhar alguns metros por uma área aberta a -18C , o que nao me fez ficar totalmente feliz, mas isso não me fez desistir. Saí caminhando pelo hotel. Cada quarto que passava e tinha alguém no local eu pedia para visitar e ficava a cada segundo mais impressionada com as diferentes decorações e arquitetura. Como se diz no Canadá, “breathtaking”. Cheguei a um salão principal com várias esculturas de gelo. Por um corredor cheguei a uma capela. Ela é usada para celebrações e casamentos, sim, casamentos, e já havia reservas para as próximas semanas.
A cada salão que chegava novas descobertas. Muitas cadeiras de gelo para você sentar, aquecedores a gás para você se aquecer. Num outro salão, algo deslumbrante, o “ice bar”. Iluminado com cores fortes, o balcão em gelo, as garrafas refletindo o gelo e luzes indiretas era algo que parecia saído de um filme de ficção. Era ali no bar onde todos os hóspedes se reuniam. De alguma forma, tinhamos que nos manter aquecidos.
Conheci pessoas do mundo todo, de todas as idades, alguns casais, pessoas sozinhas, executivos, esportistas e muitas histórias diferentes para ouvir. A integração foi muito fácil pois todos tínham o mesmo interesse, vivenciar algo diferente. Na diária estava incluído um coquetel de boas-vindas e nesse momento mais uma experiência incrível. O coquetel preparado com maestria pelos bartenders do Hotel, era servido em lindíssimos copos de gelo. A coloração contrastava com a predominância de branco do local e era um show à parte.
Impossível tomar um só coquetel. Ajudava a esquentar ...
O local, acreditem ou não, era muito intimista, e fazia você não ter vontade de sair dali. Muito papo interessante. Alguns hospedes decidiram fazer atividades externas, alguns nos tobogãs de gelo do complexo e alguns iam para o Parque Aquático que ficava no resort a uns 150m do Hotel. Nas instruções que recebi por e-mail quando fiz a reserva, dizia, “traga roupas de banho”. Na eventualidade, levei a roupa de banho mais fácil que encontrei , mas sem a intenção óbvia de usá-la. Não pretendia mergulhar em nenhuma piscina, mesmo aquecida.
Preferi ficar conversando e ficar mais um pouco mais no bar. Quando achei que a noite estava terminando, veio uma sugestão dos mais animados: Vamos para o "spa"? Eu me perguntei, quase 9 horas da noite e ir ao Spa? O Spa que as pessoas estavam se referindo eram os ofurôs que ficam numa espécie de jardim do Ice Hotel, inclusive com uma lindíssima sauna construída de madeira de carvalho. Depois de pensar em inventar uma desculpa de que estava com sono e que iria dormir, reconsiderei e pensei, por que não? No Canadá é muito comum você ter um ofurô e entrar na água quente em noites frias.
Fui para o quarto e no caminho só vinha uma coisa a minha mente, “sou completamente maluca”. Olhei para a roupa de banho que eu trouxe, um "biquini" tropical e cheguei na conclusão que realmente era mesma maluca. O Hotel tinha maiô para vender e não hesitei em comprar, pensando que poderia ajudar um pouco..... Não foi nada fácil a -5C me trocar. Na verdade, vesti em 3 segundos. Coloquei o roupão fornecido pelo hotel, meu gorro de lã, e lá fui eu rumo ao jardim de “inverno” com -18C. Foi chegar, tirar o roupão, dar aquele grito tradicional das mulheres, falar algumas palavras em português que vocês imaginam, e entrar no quente ofurô de 39C, recebida com palmas pelos outros. Cada um que chegava tinha a mesma recepção.
Foram 15 minutos de magia, eu ali no ofurô com pessoas maravilhosas que acabara de conhecer em um cenário de filme e brindada ainda com uma forte neve que caia, deixando a noite muito clara. Quando você sai do ofurô, seu corpo não sente o frio. Caminhei tranquilamente até a sauna para finalizar a "experiência". Eu mesma não acreditava que tinha feito isto, e estava viva e feliz. Dez minutos depois , peguei minhas roupas e fui para o vestiário na área da recepção. Tomei um banho quente e sequei bem o cabelo. Agora a faltava a última experiência da noite, dormir, mas antes mais uma parada no bar.....
No quarto havia um saco de dormir do tamanho do colchão. A etiqueta do saco de dormir dizia resistente a temperaturas de até -30C . Isto eu pesquisei antes, acreditem ou não, o segredo, é dormir com uma roupa leve para você não suar. Se você suar, aí sim, vai começar a passar muito frio. Depois de todas as atividades do dia, e para minha total surpresa, até que consegui dormir relativamente bem, obviamente enfiada dentro do saco de dormir até a cabeça e acordando poucas vezes durante a noite.
Levantei cedo pois iria para Quebec City onde passaria mais dois dias, desta vez, num quente Hotel tradicional da cidade. A aventura não parava por aí, pois tinha combinado um Hiking de Inverno com conhecidos e estudantes de intercâmbio.
Foi uma aventura inesquecível. Acreditem ou não, estou pronta para fazer novamente, desta vez com melhor planejamento.
Tenho vários projetos em mente para os próximos anos e um deles é levar um grupo de executivos brasileiros para o Canadá, que como eu, gostem de desafios. A ideia é fazer uma jornada de atividades profissionais como palestras, visitas a empresas e universidades, algumas atividades dirigidas de team work como hiking e desenvolver um prato gourmet numa das cozinhas dos famosos Colleges canadenses, intercalando com atividades de lazer como degustação numa das várias vinícolas canadenses, visitar uma fazenda de maple leaf e obviamente "turistar" por Toronto, Ottawa, Montreal e Quebec, e por que não, uma noite no Hotel de Glace. Alguém a fim de entrar nesta "fria" maravilhosa?
CLARICE DUARTE
CEO - Next Step Canada